Envio de Dom Leomar Brustolin: saiba como foi a missa celebrada no sábado (24)

29/07/2021

Ação de graças, gratidão, reconhecimento, homenagens. A Catedral Metropolitana testemunhou tudo isso na tarde do último sábado, 24 de julho, quando foi celebrado o envio de Dom Leomar Antonio Brustolin para a Arquidiocese de Santa Maria, onde o então bispo auxiliar de Porto Alegre assumirá como arcebispo no dia 15 de agosto. Dom Leomar foi nomeado bispo auxiliar da Arquidiocese de Porto Alegre em 2015.



"São Paulo nos exorta na segunda leitura da liturgia deste domingo a caminharmos de acordo com a vocação que recebemos. Dom Leomar, és um homem de muitos dons; e além do povo da Arquidiocese de Santa Maria, o Regional Sul 3 seguirá ganhando com sua vocação", reconheceu Dom Jaime Spengler, na abertura da celebração eucarística, quando manifestou sua gratidão pelo trabalho feito por Dom Leomar na Arquidiocese de Porto Alegre, reconheceu a amizade construída junto com os demais bispos auxiliares, e desejou uma santa missão.

Presidida por Dom Leomar Brustolin e concelebrada por Dom Jaime Spengler, Dom Adilson Pedro Busin, Dom Aparecido Donizeti de Souza e Dom Darley José Kummer, além de um grupo de presbíteros, a missa contou com a presença reduzida de público, em razão dos protocolos sanitários, e foi transmitida pelos canais da Catedral Metropolitana e Arquidiocese de Porto Alegre no Facebook, além do Youtube da Arquidiocese. 



Reflexão e agradecimento

Em sua homilia, Dom Leomar comentou a riqueza do evangelho daquele final de semana, que trouxe a narrativa da multiplicação dos pães, e finalizou destacando aspectos de sua trajetória na Arquidiocese de Porto Alegre, usando como analogia o milagre presente na mesma passagem bíblica. Para o novo arcebispo de Santa Maria, "escutar o Senhor é o fundamento de toda existência de quem crê. Para Deus, no princípio está a Palavra. Para o ser humano, no princípio está a escuta", afirmou. 

Ao se referir ao alimento que foi multiplicado por Jesus para ser dado ao povo faminto, Dom Leomar recordou que o mesmo acontece conosco em nosso cotidiano, mesmo que não percebamos. "Diariamente, a vida gratuitamente é multiplicada como dom para todos nós. Nesse milagre cotidiano também nós nem sempre percebemos o quanto somos cuidados e amados pelo Criador, escreveu Santo Agostinho". Como fez ao discípulo, Jesus também coloca a nossa fé em provação em tempos de dificuldade. Para Dom Leomar, além de não deixar faltar, Deus sempre nos dá a mais, basta que tenhamos fé. "Afinal, para Deus nada é impossível, como ouviu Maria do anjo Gabriel. A fé consiste em dar assentimento ao Eterno que entra no tempo, ao inefável que se deixa tocar, ao invisível que se revela".



No final, Dom Leomar oferece à assembleia e aos que o acompanhavam pela internet, outros "cinco pães", em tom de agradecimento pelo tempo vivido na Arquidiocese de Porto Alegre. O primeiro pão foi dedicado ao senso de pertença e de comunhão, quando Dom Leomar se referiu à convivência e amizade com os demais bispos e à união ao Papa Francisco e à Igreja. O segundo pão fez alusão ao processo de transmissão da fé, quando ele valorizou a Iniciação à Vida Cristã, iniciada em 2015 na Arquidiocese, e enalteceu o trabalho dos catequistas: "vocês são expressão viva do protagonismo do laicato na Arquidiocese, que só enriquece e completa o nosso ministério ordenado, numa eclesiologia do Povo de Deus". O terceiro pão fez referência ao trabalho por um humanismo integral e solidário, ao valorizar as atividades realizadas na Pastoral da Educação e ao exortar a todos pela "reconstrução do tecido social", urgência para o período pós-pandemia.

O quarto pão teve o papel de reconhecer o compromisso com os pobres posto em prática pela Cáritas, pela Ação Social e pela Vida Consagrada, e sublinhar a importância da relevância pública de nossa missão. Para ele, a Pastoral da Comunicação "procurou evitar uma endogenia confinada numa visão apenas interna da Igreja e noticiou nossa caridade e nosso compromisso com os pobres". O quinto e último pão refletiu a tarefa de todos em discernir os sinais dos tempos, expressão usada por João XXIII na Carta Encíclica "Pacis in Terris". Para Dom Leomar, as consequências da pandemia exigirão de nós sermos mais cuidadores das pessoas, da sociedade e da Casa Comum.

Envio à Mãe Medianeira

A Oração de Envio foi realizada em três momentos: primeiro pelos bispos, depois pelos presbíteros, religiosos e religiosas e, no final, pelos demais fiéis presentes na Catedral. Nas duas primeiras partes, Dom Leomar se posicionou de frente para o altar, e recebeu a bênção, inclinando levemente a cabeça. De joelhos, diante da assembleia, Dom Leomar ouviu a prece dos leigos que, com a mão direita estendida, pediram a Deus os dons de Sua graça para o desempenho de seu ministério pastoral.



Reconhecimento e homenagens 

A Irmã Maria Aparecida Barboza, coordenadora da IVC, conduziu a parte final da celebração, quando convidou algumas lideranças da Arquidiocese a prestarem suas homenagens a Dom Leomar. Participaram deste momento o padre José Inácio Sant'Anna Messa, representando a Ação Evangelizadora; a catequista Mariana, da paróquia Nossa Senhora Aparecida do bairro Guajuviras, em Canoas, representando a IVC; o padre Leonardo Reichert, representando a Pastoral Presbiteral; Grace Becker, representando a Pastoral da Comunicação (Pascom); padre Rogério Alencar Ferraz de Andrade, representando a Pastoral da Educação e o rabino Guershon Kwasniewski, representando o ecumenismo e o diálogo inter-religioso.



Leia a seguir, a íntegra da homilia de Dom Leomar:


 

Estimados irmãos no episcopado, Dom Jaime, Dom Donizeti, Dom Adilson e Dom Darley. Caros presbíteros, diáconos consagradas e consagrados. Estimados leigos e leigas, especialmente os queridos e queridas catequistas. Saúdo os membros da Pastoral da Comunicação e da Pastoral da Educação. Especial deferência ao Vicariato de Canoas, aonde mais me dediquei a servir nos últimos anos. Estimados seminaristas e vocacionados. Saúdo os colegas da PUCRS e o rabino Ghershon, cuja presença traduz nosso caminho comum nos passos da fé abraâmica. Sou muito grato pela presença de todos e todas.   Recebam igualmente meu especial agradecimento as instâncias da Arquidiocese que propuseram e organizaram esta celebração, especialmente a paróquia da Catedral. 

Esta assembleia reunida tem como primeiro escopo auscultar a voz de Deus que nos fala em sua Palavra, para poder comungar dignamente do pão consagrado. Escutar o Senhor é o fundamento de toda existência de quem crê. Recordamos aqui o “Shemá Israel, o Senhor teu Deus vai falar!” Para Deus, no princípio está a Palavra. Para o ser  humano, no princípio está a escuta.  

Escutamos hoje a narrativa da multiplicação dos pães. A multidão segue a Jesus, movida mais pelos sinais que ele operava em favor dos doentes. O relato está situado um ano antes da Páscoa na qual Jesus seria crucificado. Jesus levanta os olhos e contempla aquele povo. Ele percebe a necessidade daquelas pessoas. Levantar os olhos tanto é um gesto de oração como de contemplação. Toda vida cristã jamais separa a dimensão vertical e a horizontal da fé, como bem representa a cruz. Serve-se a Deus, servindo aos irmãos.  

No texto, Jesus pergunta a Filipe sobre a falta de comida para saciar aquela multidão. O Mestre coloca a prova o discípulo, para que ele entenda que não só de pão vive o homem, e aprenda a confiar irrestritamente em Deus. Afinal, para Deus nada é impossível, como ouviu Maria do anjo Gabriel. A fé consiste em dar assentimento ao Eterno que entra no tempo, ao inefável que se deixa tocar, ao invisível que se revela.

Filipe responde com a lógica da compra e venda. E André apresenta-lhes um menino com cinco pães e dois peixes. Ele traz alimentos de uma refeição frugal, mas este pouco é suficiente para o cotidiano.
 
E assim, apesar do ceticismo dos discípulos, Aquele que criou o universo se revela capaz de renovar a vida multiplicando o pouco que se tem. Pede que todos se sentem, pois vai começar o banquete messiânico. O relato nos diz também que havia muita relva verde, própria do tempo da páscoa, no mês de Nisan, quando o clima é mais ameno e a primavera é exuberante na Terra Santa.  

Chama a atenção o fato de Jesus rezar, dar graças, antes de multiplicar os pães, o que é raro nos relatos de outros milagres. Alguns Padres da Igreja viram neste gesto a solidariedade de Jesus com seu Pai e o Espírito Santo, os quais também estavam presentes com ele no primeiro ato criador. Para São João Crisóstomo, isto nos ensina que sempre devemos dar graças a Deus antes de tomarmos qualquer refeição. 

Os gestos de Jesus se repetem em cada Eucaristia: tomou o pão, deu graças, e distribuiu-o. 

A multiplicação dos pães, possivelmente, nem foi percebida pela multidão faminta. Eis o grande sinal. Diariamente, a vida gratuitamente é multiplicada como dom para todos nós. Nesse milagre cotidiano também nós nem sempre percebemos o quanto somos cuidados e amados pelo Criador, escreveu Santo Agostinho. 

E o pão que sobra revela como Deus sempre dá a mais do que necessitamos, diz Santo Efrem. Esse sinal da superabundância tem precedência no profeta Elias na casa da viúva de Sarepta e igualmente é prefigurado com o profeta Eliseu, como lemos na primeira leitura. Tudo isso ensina-nos a sermos ainda mais generosos com os dons e bens que Deus nos concede. O que sobra é recolhida em 12 cestos, indicando que nada deve ser desperdiçado do que Deus nos concede. 

Ao perceber o sinal de Jesus ocorrido, o povo decidiu proclamá-lo rei. Cristo, porém, retirou-se sozinho para o monte. O rei da eterna glória veio para servir e não para ser servido. Seu reinado subverte a forma de exercer o governo na terra. Baseia-se no serviço, no olhar atento aos servos a quem serve, em nutrir seu povo, em animar os caídos, em fortalecer o fraco.  

Também nós, seguidores do Mestre eterno, precisamos aprender a superar a lógica da compra e venda pela gratuidade. De graça recebemos, de graça devemos dar. Uma nova economia exige homens e mulheres livres da velha e superada ideia de acumular, reter e não partilhar. É urgente uma economia com coração, como diz nosso Papa Francisco, caso contrário, repete-se o absurdo de pessoas serem humilhadas em sua dignidade e direitos, por causa de dinheiro. Igualmente somos capazes de uma política melhor, como adverte a Fratelli Tutti, onde quem governa serve ao bem comum, sem corrupção e privilégios. Para muitos isso é utopia, para o evangelho é a maior expressão do Reino que esperamos na plenitude dos tempos. Enquanto vivemos na provisoriedade do tempo e da vida, somos interpelados a compreender que é dando que se recebe, é dividindo que se multiplica, é servindo que se lidera, e é morrendo que se vive para a vida eterna.
 
Ao concluir esta celebração, finalizando meu tempo na Arquidiocese de Porto Alegre, pretendo de forma muito breve, sem multiplicar as palavras, mas em tom de agradecimento, quero multiplicar e partilhar  cinco pães, como no Evangelho. Não é uma memória do que foi vivido, apenas destaques que gostaria de dividir para multiplicar.

Primeiro pão: o senso de pertença e de comunhão. Aqui agradeço a Dom Jaime Spengler que me ordenou bispo e acolheu-me com seu bispo auxiliar. Igualmente agradeço a convivência com os bispos auxiliares: Donizeti, Adilson e Darlei. Juntos compartilhamos celebrações, refeições e reuniões sempre no ideal de estarmos colegialmente unidos ao Papa Francisco cum Petro e sub petrum. Somos a Igreja Povo de Deus, a ela servimos e a ela nos entregamos até que venha o Reino definitivo. Permaneça nossa unidade no colégio apostólico pelos vínculos da caridade de Cristo.

Segundo pão: o empenho em transmitir a fé numa sociedade plural. Aqui quero abraçar cada catequista da Iniciação à Vida Cristã. Hoje recordo os dias de implantação desse projeto em 2015. Recordo também a formação discipular, interrompida pela pandemia, mas não encerrada. Confesso que não esperava conhecer tantos homens e mulheres que de forma incansável se dedicaram a formar discípulos do Mestre. Você são expressão viva do protagonismo do laicato na Arquidiocese, que só enriquece e completa o nosso ministério ordenado, numa eclesiologia do Povo de Deus.

Terceiro pão: o trabalho por um humanismo integral e solidário. Aqui se encontra todo empenho da Pastoral da Educação, das nossas visitas há 47 escolas da Arquidiocese nos anos de 2017 e 2018, dos encontros formativos, da produção de materiais. Creio que a Campanha da Fraternidade de 2022 nos ajudará muito, pois nos exportará  a falar com sabedoria e ensinar com amor. No período pós-pandemia a reconstrução do tecido social dependerá de uma proposta educativa humanista e integral. Nisto somos peritos, como afirmou São Paulo VI em seu discurso na ONU.
 
Quarto pão: relevância pública e caridade. Para superar tantos desafios do nosso tempo, é preciso ter uma relevância pública da fé, capaz de converter os corações mas igualmente transformar a realidade. Aqui reconheço o valor da Pastoral da Comunicação que procurou evitar uma endogenia confinada numa visão apenas interna da Igreja e noticiou nossa caridade e nosso compromisso com os pobres. Igualmente reconheço o valor de somarmos forças com quem trilha os mesmos caminhos, como fizemos com irmãos israelitas. Inesquecível foi a Ceia Judaica celebrada em comum. E digno de nota é o trabalho da cáritas e da ação social, bem como da vida consagrada nesta Arquidiocese como expressão de uma Igreja samaritana.

Quinto pão: é uma tarefa comum, escutar os sinais dos tempos. Essa categoria foi dada por João XXIII na Pacis in Terris. Tornou-se um orientação metodológica de grande valor. O que esta pandemia e seus desdobramentos estão nos indicando? Novos desafios já estão nos provocando. Cada geração deve dar as razões de sua fé e sua esperança, parafraseando São Pedro. Creio que temos um longo caminho a percorrer, o que exigirá sermos mais cuidadores das pessoas, da sociedade e da Casa Comum.  

Agradeço a Deus cada pessoa que foi companhia no caminho de fé e de vida nesse tempo na Arquidiocese de Porto Alegre. Agora que recebo uma nova missão, na Arquidiocese de Santa Maria, me comprometo rezar por todos vocês, que sejam missionários do cotidiano, atentos aos sinais deste tempo. Aos pés da Medianeira de todas as graças confio a vida de cada um e de cada uma. Muito obrigado foi um grande privilégio que Deus me concedeu conhecer, conviver e caminhar com cada um e cada uma. Sejam sempre bem vindos à Santa Maria! Rezem por mim, e eu rezarei por vocês. 



Autor:
Textos e fotos: Juliano Rigatti e Kelly Girardi

Fonte:
Ascom

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